Reencontros - Cosme, Nova York



Tenho um amigo que muda de estilo de acordo com a namorada. Para fins literários, vamos chama-lo de 'F'...

Nos conhecemos em sua fase hippie, quando andava de chinelos, cabelos desgrenhados, umas calças meio estropiadas e namorada idem. Como a primeira impressão é a que fica, tive dificuldade em me adaptar ao novo estilo “cabelos rentes, calça bege, cinto e camisa azul”, que apresentou ao acompanhar uma menina do mercado financeiro, de escovado calculado.

Para mim, o amigo "original" sempre foi o hippie, mesmo sabendo de suas sete personalidades anteriores, adquiridas e perdidas com namoradas póstumas.



Conheci a cozinha de Enrique Olvera no PUJOL, sobre a qual escrevi [aqui] e tenho certeza que não volto à Cidade do México sem bater meu ponto. Foi uma refeição impactante, com impecável utilização de ingredientes locais. E lá fui eu, ansiosa por reencontrar os pratos de Olvera no COSME, seu filho nova-iorquino. É claro que, a exemplo de 'F', a namorada era outra.

No original mexicano, pequeno e intimista, comi larvas, cactos, formigas secas e por aí vai. No COSME, que não pretende – e nem deve – ser seu precursor, a namorada não come formiga desde criancinha e se arrepia com a textura escorregadia das larvas de insetos.

Comi pra lá de 9 pratos, todos saborosos, mas destaco aqui alguns, a começar com a delicada cobia (beijupirá) al pastor, com purê de abacaxi e coentro.



















Fui com toda a expectativa numa tostada de ouriço com abacate, molho de tutano e pepino (acima), que condensava todos os ingredientes pecaminosos possíveis. Apesar de saborosa, perdeu para um despretensioso tamal de batatas com feijões ayocote, ricota fresca e molho de pimenta morita (abajo e adentro).


Um dos pratos icônicos da casa tem preparação longuíssima e original. São as "carnitas" de pato, curadas, temperadas e assadas em baixa temperatura por uma noite inteira no suco da própria carne com laranja e "cola" mexicana. Para os famintos...



Mas o melhor da noite foi o merengue feito da folha da espiga com etérea mousse de milho. Depois de comer este prato, quis entrar como Alice no País das Maravilhas, no buraco da fechadura abaixo e recomeçar a refeição pelo fim.



Seria impossível reproduzir uma cozinha tão autoral quanto a do Pujol num ambiente tão grande como o do Cosme. Também seria improvável que o chef conseguisse trabalhar com todos aqueles ingredientes únicos, tanto pela dificuldade de fornecimento, quanto pela cultura tão distinta.






E meu amigo?

Encontrei com ‘F’ recentemente, acompanhado de outra menina, com jeitinho de intelectual. A passagem pelos quarenta lhe emprestou um par de óculos austeros que o colocava pari passu com sua nova companheira. Relembramos os velhos tempos e percebi que, apesar da saudade do amigo original, bom mesmo é perceber que continua genial.

A deliciosa sidra austríaca que regou
o início dessa estória.



COSME NYC
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+1.212.913.9659
de segunda a quinta-feira, das 17:30hs às 23hs
sextas e sábados, das 17:30hs a meia-noite
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Cristiana Beltrão

Esse blog surgiu da necessidade de organizar dicas de restaurantes, paradinhas, bares, mercados e bebidas ao redor do mundo para os amigos. De quebra, acabei contribuindo para jornais e revistas Brasil afora. Espero que gostem.